domingo, 3 de outubro de 2010

A Sociedade do Telejornalismo - Apresentadores Estrela

Neuber Fischer

Há algum tempo, a televisão vem se firmando como principal meio de comunicação de massa, é nela que grande parte da população busca informação e entretenimento. Com isso, cada vez mais ela dita as regras, não só do que deve ser visto como informação, mas ela mesma adquire status de informação em outros meios. Esse movimento demonstra a dominação da TV sobre as demais mídias. “Os profissionais de rádio e impresso se informam pela televisão...” (RINCÓN, 2003, p. 47 apud HAGEN, 2008, p. 29).


Com a relevância dos telejornais, os apresentadores também ganham rótulos de artistas, fazem editoriais de moda, concedem entrevistas, falam sobre a vida pessoal, abrem suas casas, frequentam festas e se tornam alvos das colunas sociais e de fofocas. “Deixam de ser os produtores da informação para ser a própria notícia” (HAGEN, 2008, p. 30). Esta situação nos faz lembrar o que acontecia com as estrelas hollywoodianas dos anos dourados, e assim como eles, os jornalistas se tornam modelos de conduta para o público. Da mesma forma que a sociedade em geral, os jornalistas também têm problemas de família, profissionais, etc. Quem melhor administrar essa realidade, se tornar um mito, uma referência. Assim, está explicitado um conflito da imagem dos jornalistas enquanto estão na TV, ocupando um espaço do real, sendo amparados e legitimados pelo discurso da verdade, e “paradoxalmente, fora do universo televisivo, constroem uma vida espetacular, justamente no que o senso comum convencionou chamar de “vida real’” (HAGEN, 2008, p. 31). Desta forma glamourizam o ponto em comum entre o jornalista e o público, o cotidiano, de onde, por sinal, o jornalismo tira sua matéria prima.
Este conflito gera a questão: como é possível aos jornalistas, preocupados com a verdade, objetividade e imparcialidade, se deixarem levar por aquilo que renegam, tornando-se a notícia. O objetivo deste artigo não é apontar nomes, mas compreender o processo de construção dos apresentadores-estrelas.


Isso se dá pelo “entrelaçamento entre o jornalismo e as estruturas míticas, que de forma simbiótica, atua subjetivamente na construção dos indivíduos” (HAGEN, 2008, p. 31).


Algumas pistas estão no fazer profissional do jornalismo, o acontecimento, o quanto mais raro mais importante. O pensamento mítico que fundamenta e articula o fazer da notícia. Acontecimento, jornalismo e construção do pensamento se encontram. Ao trabalhar com o racional, o dia-a-dia, os jornalistas não param de pensar em fatos que lhe chamam atenção, fatos estes que também atraem o público.


O discurso racional e o subjetivo se misturam, um complementa o outro e agem sobre o pensamento humano sem percebermos. “Comunicação é mito...” (TÁVOLA, 1985, p. 225 apud HAGEN, 2008, p. 34) e essa é a base do jornalismo.


O jornalismo é compreendido pela teoria construcionista, com as rotinas de trabalho sistematizadas e os modelos noticiosos predefinidos. Mas essa interação ultrapassa o espaço da redação e abrange as fontes de informação, outros jornalistas e profissionais de outras categorias.


Ao se aceitar a notícia como produto cultural tem-se um resultado que ordena o imprevisível e o inesperado que serão processados em notícia. É preciso compreender o jornalismo como construção a partir de possibilidades mediadas e nunca de afirmativas absolutas. O jornalismo não se constitui em um discurso de primeira mão, ele incorpora a fala de outras áreas. É nessa interação, na apropriação de múltiplas vozes, que o fazer jornalístico se apresenta genuíno, detentor do espaço que ocupa, o porta voz da sociedade. E ao ocupar esse espaço os jornalistas se reconhecem como tal. O locutor que fala é legitimado pelo lugar que ocupa, o jornalista em relação ao público, a autoridade que tem ao falar para o outro.


Temos assim o discurso jornalístico como produtor de sentidos. O desafio do jornalista é escolher o que falar. Um mesmo discurso pode ser dito de diversas formas, gerando infinitas interpretações.


O jornalista acredita ser dono de um discurso isento e objetivo, quando na verdade carrega na subjetividade. Escolhe, processa, redige e apresenta a notícia ao seu modo. Vale lembrar que o jornalismo é sempre um discurso sobre algo ou alguém. Busca-se a realidade, quando só é possível tocar o real.


É interessante observar como o jornalismo atua na confirmação de um discurso, nos desdobramentos dos fatos, esse movimento causa a sensação de familiaridade com o leitor, pela repetição, dando ao jornalista a crença de que sabe o que fala e com quem fala. Situação em que o “eu” e o “tu” podem trocar de lugar. É o que faz o jornalista acreditar que conhece seu público mesmo sem ter contato com ele.


É impossível deixar de lembrar que os jornalistas ao trabalharem com a construção da notícia, tornam-se “mestres” no uso da paráfrase, a repetição. Ao mesmo tempo em que se utilizam da polissemia para dizer o mesmo de forma diferente.


A pragmática da profissão se expressa através de uma base discursiva, o fazer buscar forma e/ou conteúdo para se manter em concordância com o público. Público esse, que nada mais é do que uma posição de sujeito que os próprios jornalistas ocupam quando interagem com as outras mídias ou com veículos concorrentes aos seus. Mas, saindo da posição de espectadores e voltando a ocupar o espaço do jornalista, não tem como impedir que o imaginário da posição de “público” reforce ou transforme o sujeito-jornalista.


Essas formas míticas, travestidas de informação, ganham o status de notícia. “Assim, com o verniz de legitimidade, não causam estranhamento em uma época que profere o discurso da racionalidade, conseguindo atuar sobre um campo que pretensamente tenta negá-la” (HAGEN, 2008, p. 42).


Isso só é possível porque, ao reproduzir uma ideia, o jornalismo tenta imputar ao discurso uma verdade única e incontestável. É essa credibilidade – jornalistas que avalizam jornalistas – que ganham contornos únicos na mídia que trata de famosos e personalidades, pois mantém intacta, a pretensa credibilidade e objetividade da informação, sem deixar de oferecer uma dose de espetáculo. Isso possibilita, que ao contrario dos famosos, os jornalistas recebam um status de “únicos” de uma “sobrepersonalidade”, unindo o que dois mundos têm de mais marcante: o glamour e o marketing de um, com a credibilidade e a veracidade do outro, o atestado de que tudo que fazem é real, inclusive as possíveis estratégias de marketing.


Decifrar a sutileza desse movimento... é compreender uma das vertentes do jornalismo praticado hoje, sem desprezar uma tendência que parece ganhar cada vez mais espaço na mídia nacional (HAGEN, 2008, p. 43).


Resenha produzida para crédito à disciplina Telejornalismo, do 6º período do curso de jornalismo FAPCOM.

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